A Tartaruga-de-Couro e a Areia que Sumia - Erdna Ziul Sedranreb

A Tartaruga-de-Couro e a Areia que Sumia
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Na costa luminosa do Rio Grande do Norte, onde o litoral encontra o céu numa linha azul sem fim, uma velha e sábia tartaruga-de-couro, chamada Corina, voltava à praia onde nasceu, décadas atrás. Era tempo de desova, e seu instinto a guiava. Mas, ao alcançar a enseada que guardava em sua memória, Corina sentiu algo faltar.

— Onde está a areia quente? — murmurou. — Onde estão as dunas que cantavam ao vento?

Ao olhar em volta, notou que o espaço onde centenas de tartaruguinhas outrora nasceram havia se transformado em pedras nuas e galhos tombados. A erosão havia roubado o ventre da praia.

Enquanto observava o oceano, Corina escutou um estalo seco vindo do coqueiral. Era Domênico, um jovem guaxinim-do-nordeste, curioso e cheio de energia, que rondava a praia procurando frutos. Viu a tartaruga e se aproximou com cautela.

— Dona Corina? A senhora parece preocupada.

— Estou, Domênico. Esta praia era um berçário para minha espécie. Agora, ela sangra aos poucos, levada pelo mar.

— Isso é a tal da erosão que o velho peixe-boi comentou outro dia?

— Sim. A erosão costeira. Ela acontece quando os homens mexem demais onde não deviam — respondeu Corina, fixando os olhos no horizonte.

Domênico olhou para o mar e depois para as casas novas, muito próximas da costa.

— Eles derrubaram os coqueiros e colocaram muros. Disseram que era para proteger do mar.

— E ao tentar se proteger do mar, se esqueceram de proteger o mar — disse Corina, com voz pesada.

Ao ouvir aquilo, Domênico se sentiu pequeno, como se o vento levasse suas certezas. Foi então que teve uma ideia:

— Dona Corina, a senhora conhece a estória do tatu-peba da Caatinga?

— Não conheço. Me conte.

— O tatu chamava-se Zino, e um dia, ao ver que seu abrigo de barro secava, cavou fundo até encontrar água. Mas, ao fazer isso, drenou o último lençol freático da região, e toda a vegetação ao redor morreu. Ele entendeu tarde demais: cavar só para si é um caminho sem retorno.




Corina ficou em silêncio, sentindo que havia uma verdade espelhada ali.

— Bonita estória, Domênico. E cheia de sabedoria. Como muitas que vêm dos animais deste nosso Brasil.

Ao longe, voava Anaiá, a fragata, ave do alto-mar que fazia ninho nas falésias do Ceará, mas que agora sobrevoava o Rio Grande do Norte procurando abrigo.

— A areia não é só sua, Corina — gritou ela, com as asas largas como um veleiro. — Também perdemos falésias e ninhais. A costa está recuando. Os homens constroem para agora, mas esquecem do futuro.



Corina afundou levemente a cabeça. Era verdade. O cuidado com a ecologia era uma ponte entre o presente e o amanhã.

Naquela noite, reuniram-se à beira-mar: Corina, Domênico, Anaiá, e até o velho peixe-boi-marinho de Touros, chamado Valente. Conversaram sob a lua cheia sobre o que fazer.

Valente contou uma estória antiga, passada de geração a geração pelos peixes dos recifes:

— Houve um tempo em que os corais eram coloridos como arco-íris. Mas o calor do mundo aumentou tanto que eles começaram a morrer. Um pequeno cavalo-marinho-de-abrolhos, chamado Ciro, decidiu proteger um recife inteiro levando larvas de coral em sua cauda, nadando quilômetros, plantando esperança onde havia só branqueza.

— Então ele lutou com esperança? — perguntou Domênico.

— Não só com esperança, com ação — corrigiu Valente. — Ele fez o que pôde, onde pôde. E inspirou muitos.



 

Corina então tomou uma decisão. Reuniria tartarugas-de-couro de outras praias. Iria até o Piauí, conversar com as irmãs que desovam no Delta. Pediria ajuda às araras-azuis do Tocantins, que guardam saberes antigos do cerrado. Iria contar estórias, formar alianças, despertar nos animais e nas crianças humanas um sentimento de pertencimento.

— Se não podemos deter o oceano, podemos aprender a viver com ele, em harmonia, não contra ele — disse Corina com os olhos brilhando.

Domênico sorriu.

— Eu também vou espalhar as estórias. Meus primos vivem perto de dunas, e eles escutam os homens. Talvez escutem melhor se eu falar com o coração.

Meses se passaram. As praias começaram a ter novos cuidados. Crianças plantavam restingas, famílias construíam com distância segura do mar, e escolas começaram a ensinar sobre preservação ambiental.

A areia não voltou toda, mas Corina pode, enfim, enterrar seus ovos com a esperança de que seus filhos conheceriam um litoral ainda vivo.

E uma noite, ao ver uma pequena tartaruguinha rompendo a areia em direção ao mar, Corina sussurrou:

— Que você nade não apenas com força, mas com consciência. O oceano é teu lar, mas também tua responsabilidade.




 

A lição de moral ecoou pelo vento, alcançando o coração de quem passasse por ali:

"Cuidar da natureza é cuidar do tempo que ainda não chegou. O que se faz hoje constrói, ou destrói, o chão onde pisarão os que virão."

Assim, vamos tornar a fábula da Tartaruga-de-Couro e a Areia que Sumia, conhecida em todo o litoral do Brasil, ensinando que o cuidado com a terra e o mar é o único caminho para que exista futuro!


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